Espécie de “Big Brother caipira” já foi conduzido com Bovinos Pantaneiros e resultados ultrapassaram 99% de acerto
Brincos, tatuagens, marcações com ferro e fogo. Todas essas formas de identificar bovinos nos pastos podem estar com os dias contados. A pecuária do futuro já está fazendo experimentos para tornar possível e viável a identificação de animais com o uso de imagens. Uma espécie de ‘big brother’ caipira, mas de extrema utilidade para a atividade econômica. Algo semelhante com o que a TV mostra em grandes aeroportos asiáticos: a identificação facial de humanos.
Pesquisas nessa linha já foram publicadas em 2020 na revista ‘Computers and Eletronics in Agriculture’, da Elsevier. No caso, o resultado bem-sucedido foi com a raça bovino Pantaneiro. Utilizando um sistema de redes neurais convolucionais (CNN), o estudo empregou três modelos de arquitetura de redes neurais para a identificação do bovino Pantaneiro.
Os estudos são liderados pelo cientista da computação Fabrício de Lima Weber, que é mestre em zootecnia pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) e em computação aplicada pela Facom (Faculdade de Computação) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
Fabrício diz que além do bem-estar animal, uma das vantagens do sistema de identificação por imagens é a economia. Hoje, os brincos utilizados são importados e o dólar anda bastante instável. O produtor que utiliza esse sistema precisa comprar também o bastão de leitura do código impresso nos brincos. Quando o animal perde essa identificação no pasto, é preciso repor.
“O sistema por imagem poderá agilizar o transporte de animais e a emissão da GTA (Guia de Trânsito Animal)”, afirmou Fabrício, já vislumbrando a abertura da Rota Bioceânica, que ligará o Brasil ao porto do Chile, facilitando o embarque de animais para a Ásia. Estudos anteriores já avaliaram a pesagem de animais por imagens do dorso.
De acordo com o pesquisador Urbano Gomes Pinto de Abreu, da Embrapa Pantanal (Corumbá-MS), outro autor da publicação, foram utilizadas imagens capturadas por meio de vídeos por quatro câmeras de monitoramento. “Depois foram extraídas imagens de determinados quadros que continham o objeto de interesse: o dorso, o perfil, a lateral e a face de cada bovino”, explicou.
Na etapa de classificação foram comparados três modelos bem conhecidos de aprendizagem profunda na literatura: InceptionResNetV2, Resnet-50 e DenseNet201. Os resultados experimentais mostram que modelos de arquiteturas utilizados na pesquisa alcançaram ótimos resultados, chegando a 99,86% de acerto. “Os resultados indicam que os modelos avaliados podem apoiar pesquisadores e pecuaristas no reconhecimento de bovinos Pantaneiros. É um método que colabora para o bem-estar dos animais”, afirmou.
Segundo os autores, também ficou evidenciado que modelos de redes neurais convolucionais podem ser base de um sistema de visão computacional, para que a identificação dos animais seja feita automaticamente.
Para este experimento, foram mobilizados 51 animais da raça, de idades variadas e ambos os sexos. As imagens que formam o conjunto de dados foram coletadas em 25 de janeiro de 2019, entre 13h50 e 15h48 no Núcleo de Conservação de Bovinos Pantaneiros de Aquidauana (Nubopan), na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
27 mil imagens
Os vídeos coletados foram armazenados e transferidos para computadores. Em seguida, foram analisados e divididos em 212 vídeos menores, de onde foram extraídos os quadros que continham imagens dos animais para a formação do banco com 27.849 imagens dos bovinos Pantaneiros.
As três arquiteturas utilizadas apresentaram taxas de precisão que variaram de 98,87% a 99,86% e tempo de processamento de imagens de 13 horas e 14 minutos (mínimo) a 54 horas e 4 minutos (máximo). Esses cálculos consideram duas etapas: a de aprendizagem da máquina, quando ela captura e processa as imagens, criando um banco de dados; e a de validação, quando imagens inéditas são apresentadas às máquinas para o reconhecimento e identificação.
Após o sucesso do experimento com o bovino Pantaneiro, Urbano conta que a próxima etapa é pesquisar os algoritmos que permitam desenvolver a mesma técnica para a identificação por imagens de gado Nelore, que representa a raça de corte mais disseminada no Brasil.
Antes, porém, Fabrício pretende desenvolver um aplicativo para que a identificação dos bovinos Pantaneiros já estudados possa aparecer na tela de um celular. “Se o produtor estiver em uma feira agropecuária, por exemplo, ele pode acessar os dados do animal pelo aplicativo e conhecer o histórico da raça”, disse o cientista da computação.
Também são autores do trabalho Vanessa Aparecida de Moraes Weber, Geazy Menezes, Adair da Silva Oliveira Junior, Daniela Arestides Alves, Marcus Vinícius Morais de Oliveira, Edson Takashi Matsubara e Hemerson Pistori.